Munique e Valência apresentaram propostas para ficar com o evento que todos os anos traz empresas, atenção e dinheiro a Lisboa. Outras cidades também já mostraram interesse.
Em Novembro, a terceira edição da Web Summit poderá ser a última em Lisboa. Portugal está agora na corrida com outras cidades para continuar a acolher nos próximos anos um evento que ajudou a colocar o país no circuito mundial da tecnologia – e cuja saída terá consequências para o empreendedorismo português.
“Foi notório o quanto alterou a percepção de Portugal e dos seus empreendedores”, observa Pedro Manuel Costa, associado do Institute of Public Policy, um think tank em Lisboa. “Deixámos de ser apenas o país das praias e do surf, para passarmos também a ser um bom país onde investir e onde trabalhar.” Pedro Manuel Costa receia o impacto da eventual deslocação da Web Summit: “Alguma da atenção que ganhámos irá manter-se, mas vamos deixar de ser o país da moda das startups. Será sempre muito mais difícil corrigir as debilidades de um ecossistema que está ainda longe de se consolidar.”
O gabinete do Ministério de Economia, responsável pelas negociações, disse ao PÚBLICO que “os contactos com a Web Summit continuam a decorrer” e que se mantém a possibilidade de o evento continuar a ser na capital portuguesa. A Web Summit confirmou as conversas, mas recusou-se a dar detalhes. Em Maio, o director de comunicação da conferência, Mike Harvey, tinha dito à agência Lusa que a organização estava “em negociações com muitas cidades”. Por ora, há duas candidaturas que são públicas: Munique, na Alemanha, e Valência, em Espanha.
Até agora, o investimento do Estado português foi de 1,3 milhões de euros por ano, repartido por várias entidades públicas. Valência propõe pelo menos cinco milhões de euros por ano para um acordo de cinco anos garantidos e outros cinco opcionais. Munique, que quer o evento por um mínimo de sete edições, avançou com um investimento de pelo menos 850 mil euros por ano. Ambos os valores podem subir se as cidades forem escolhidas.
Em Portugal, “o acordo sempre foi de três anos garantidos, e dois anos de opção”, lembrou ao PÚBLICO um porta-voz da câmara de Lisboa, frisando que a notícia da candidatura espanhola não altera nada. A câmara recordou que a vinda do evento para a capital portuguesa só foi anunciada após o final da última edição em Dublin, em 2015. Em Lisboa (que na altura ganhou a disputa a cidades como Paris e Amsterdão), a Web Summit encontrou mais apoios públicos e condições para receber mais participantes do que na capital irlandesa, onde os hotéis e os transportes foram apontados como um problema pelo fundador da conferência, Paddy Cosgrave. Berlim, Paris, Madrid, e Londres são outras cidades interessadas em ficar agora com a Web Summit, mas não se conhecem detalhes das candidaturas.
Impactos múltiplos
Desde 2016, a Web Summit trouxe até Portugal investidores, startups e executivos de grandes empresas – e muito dinheiro. As últimas duas edições geraram 300 milhões de euros cada só em serviços relacionados com o alojamento e o transporte das quase 80 mil pessoas que estiveram no evento, segundo números do Governo e da organização. Em Novembro, a secretária de Estado para a Indústria, Ana Lehmann, descreveu este valor como a “ponta do icebergue”. Porém, e para um evento que se gaba de pôr investidores e empresas em contacto, ainda não há informação sobre os investimentos em startups portuguesas, dezenas das quais foram à Web Summit com o apoio do Governo.
“Não se pode fazer essa avaliação a curto prazo. Gostava de ver relatórios sobre o impacto económico e ganhos directos, mas isso demora tempo”, diz ao PÚBLICO Carlos Oliveira, membro do Conselho Europeu para a Inovação e presidente da agência de investimento InvestBraga. “Vai levar anos para ver o impacto nas pequenas empresas e startups. É um tipo de marketing importante para o país.”
Dados recentes da Tech.Eu, uma analista do mercado europeu de tecnologia, mostram que o número de startups portuguesas a obter financiamento tem diminuido face ao resto da Europa. Em 2016, as startups portuguesas tinham participado em 27 rondas de investimento. Estavam no 17.º lugar do top 20 europeu (as startups francesas ocupavam o primeiro lugar, com 591 rondas de investimento). Em 2017, Portugal não fez parte da lista.
Aquela informação deu azo a debate nas redes sociais depois de partilhada por Nuno Sebastião, presidente executivo da Feedzai, uma empresa portuguesa que desenvolve tecnologia para detectar fraudes em transacções e pagamentos. “O que acho que falta em Portugal é ambição”, escreveu Sebastião no Facebook. “A malta fica-se pelo medíocre, pelos caminhos para o Web Summit, pelos concursos de inovação, pelas meetups [encontros].”
“As startups não podem depender da Web Summit. É apenas uma ferramenta”, argumenta também Carlos Oliveira. Para o presidente da InvestBraga, não se pode culpar Portugal se o evento sair do país: “Faz parte do modelo de negócio do evento procurar outras cidades. Seria fantástico se a Web Summit ficasse em Portugal pelo menos mais dois anos, mas não é o fim do mundo se 2018 for a última edição.” Defende que o mais importante da conferência são “os contactos que se fazem com pessoas de todo o mundo”. E refere que, para as startups portuguesas, o facto de a Web Summit ser em Lisboa ou noutro local tem pouca importância: “A diferença é cerca de 500 euros, que é o preço do bilhete de avião para a equipa.”
Fonte: Publico.pt
KARLA PEQUENINO 9 de Junho de 2018
karla.pequenino@publico.pt